terça-feira, 9 de junho de 2009

Manual do Expatriado para Totós

Angola tem sido vista por muitos portugueses como o novo El Dorado, no entanto é preciso ver que isto aqui não é o país das maravilhas, já muitas empresas tentaram entrar aqui e deram-se mal, com prejuízos consideráveis. O mesmo se pode dizer relativamente a muitos trabalhadores, iludidos com o ordenado proposto (aí os dólares), e não fazendo contas aos gastos que aqui têm, acabam por ficar quase na mesma do que se trabalhassem em Portugal, só que estão longe.

Por isso, na sequência da brilhante e vasta colecção da Porto Editora "Para Totós", vou deixar-vos aqui algumas considerações minhas, que valem o que valem, mas sempre ajuda a perceber um pouco mais a realidade que aqui vão encontrar.

Dado aqui falar-se muito em dólares, quando se tratam de valores mais significativos, e porque $1200 usd são 900€, às vezes poderá dar a sensação de ser uma quantia muito maior, portanto vou falar sempre em Euros.

- Visto
O visto ordinário, permanência de 30 dias (renovável por mais 30), pode demorar um mês ou mais a consegui-lo, quanto ao de trabalho (válido por um ano), é necessário contrato de trabalho, e passados 2 meses de cá estar, ainda estamos à espera. Mas o processo sempre pode ser "agilizado".

- Viagens
Para Luanda só existem duas companhias com voos directos de Portugal, a TAP e a TAAG (através da South African Airlines, porque está impedida de voar para a Europa). Pode ir dos 1200€ até aos 2000€ , sendo que na TAP são mais caras. Não ter as viagens a Portugal pagas pode ser muito mau para o bolso.
Se fizermos 3 viagens num ano, são perto dos 4500€, o que equivale a 200€/mês aproximadamente.

- Estadia
As casas em Luanda atingem valores exorbitantes, quer na compra, quer no arrendamento. Ouve-se falar em valores que vão desde os 2000€/mês, por um cubículo T1, a 20.000€/mês, por uma casa com 3 ou 4 quartos. Certo é que ainda ontem, um local nos disse que pagava cerca de 200€/mês por uma casita fora da cidade, com boas condições... Agora, não sei é a localização nem as condições. Um branco não pode ir morar para qualquer sítio aqui em Luanda, disso não tenho dúvidas, e geralmente as casas, condomínios ou edifício, não é nada de estranhar terem um segurança à porta.
Para além dos custos, também não é fácil encontrar casas disponíveis, por isso se a vossa empresa não tratar da estadia, contem com um rombo no orçamento e uma carga de trabalhos.

- Condições da habitação

Faltas de electricidade e de água, são o dia a dia de muita gente aqui em Luanda. Por isso se não querem ficar privados de água para o banho durante 4 ou 5 dias, e ter a comida a descongelar ou a apodrecer no frigorífico, arranjem uma casa com gerador eléctrico, depósito de água e bomba. Obviamente que isso faz a diferença na hora da renda.
Isso, e a quantidade de espécies animais e de rastejantes com que irão co-habitar. Em edifícios mais antigos no centro de Luanda, esperem por um ou outro rato nas escadas e baratas, se entram ou não no apartamento, isso depende da vossa hospitalidade, e da vossa necessidade de fazer amigos novos, ou ter um animal de estimação exótico.
Aqui nesse ponto não me posso queixar, porque a empresa tratou de tudo, desde casa aos equipamentos.

- Alimentação
Fazendo uma alimentação típica de um trabalhador em Portugal, ou seja, almoçar fora, e jantar em casa, façam contas com um custo médio entre 12€ a 20€ por almoço num tasco (isso se não forem muito esquisitos nem membros da ASAE), fica em mais ou menos 300€/mês para almoços. Juntem mais uns 300€/mês para compras e refeições em casa, e alimentação pode ir até aos 600€ ou mais.
Façam contas ao que gastam em Portugal e multipliquem por 2, para terem uma ideia do que podem gastar.

- Carro
Os carros em Angola até que não são caros, mas não deixa de ser um investimento a fazer caso a empresa não inclua nas condições oferecidas. Além disso, têm um desgaste grande, devido às condições da estrada e distâncias. Ter A/C é 100% recomendável, visto que não vai querer andar de vidros abertos com o carro parado em filas, é sempre uma janela de oportunidade (belo trocadilho...) que se abre para os amigos do alheio.
A Gasolina aqui custa 40cts o litro, é barata. Atesta-se um depósito de 40lts por 16€. Não vai ser por aí que se fica pobre.
Eu diria que é obrigatório ter carro, os transportes públicos não são eficientes, nem muito utilizados pelos pulas.

- Carta de condução
Após termos visto de trabalho já podemos pedir carta angolana. Até lá, uma carta internacional (faz-se num qualquer Automóvel Clube de Portugal) dá para o gasto.
Já ouvi dizer que a carta portuguesa e válida por cá, mas não confirmo isso. Depois da história do Mantorras as coisas ficaram meio confusas por cá. E quanto menos brechas para gasosa dermos aos agentes da autoridade, maior terá de ser a capacidade de imaginação deles na hora. E sempre se pode apreciar as verdadeiras pérolas que dali saem.

- Staff
Aqui inclui-se empregada, segurança, motorista. Não recebem ordenados muito elevados, podendo andar à volta dos 300€/mês. O segurança geralmente é do condomínio, a empregada dá sempre jeito, e um motorista, só mesmo em último caso, se não se adaptar ao trânsito e ruas de Luanda, ou no início para as conhecer.

- Saúde
Aqui há hospitais públicos e clínicas com boas condições, só que são caros. Não tive ainda a necessidade de recorrer a esses serviços, por isso não sei se funcionam bem, ou quais os seus custos.
Só sei que o facto de não ver muitas ambulâncias, o trânsito difícil, a juntar ao facto de no número de emergência, o 113, ser frequente não sermos atendidos, deixa-me de pé atrás de como será numa situação de emergência médica.

- Padrões e exigência

É essencial para a nossa sanidade mental, e para conseguirmos sobreviver em Luanda por algum tempo, baixarmos os nossos padrões de exigência, de qualidade de serviço, de higiene, de nível de vida, e de serviços disponíveis.
Caso contrário dão literalmente em doidos se não conseguirem aderir ao lema "não há maka"!

- Ordenado
Com tudo isto, facilmente se percebe que aliciarem-nos com um cheque de 4000€ por mês, sem quaisquer das regalias acima mencionadas incluídas, não é uma boa proposta. Habitação (2000€), carro (200€), comida (600€), e viagens (200€) podem transformar-se num gasto mínimo de 3000€/mês. E temos sempre outros gastos, com fins-de-semana, artigos para a casa, roupa, saúde, e passa-tempos.
Façam contas ao ordenado, mais as condições oferecidas pela empresa, e acima de tudo, vejam lá se o que sobra no fim do mês, compensa o esforço e sacrifício de estar longe de casa e do que nos é querido.

- Impostos
Não sei ao certo como funcionam por cá. Se existe segurança social, ou como funciona. Posso apenas dizer quais são as condições que tenho. A empresa paga-me o ordenado em Portugal, desconta em Portugal para a Seg. Social (para anos de reforma), e paga uma espécie de IRS aqui em Angola, o IRT (Imposto sobre Rendimento de Trabalho), à taxa de 15%, que parece-me ser fixa, ao contrário do IRS.
Se num ano ficarmos menos de 180 dias em Portugal, podemos pedir uma mudança de residência fiscal para o estrangeiro, e assim fica-se isento de fazer IRS deste ano.



Se tiverem uma proposta para trabalhar em Angola, pensem bem nas condições oferecidas e aproveitem essa mensagem para fazer umas continhas rápidas.
Tenham bem conscientes quais são as motivações para vir para Luanda, se a experiência profissional e de vida em si, se é poupar uns trocos, ou se é viver uma vida mais desafogada.

10 comentários:

  1. Foi para ficar longe de ti! Foi a proposta para mais longe que consegui! :D

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  2. Só que depois fiquei com saudades...

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  3. Olá

    Estou se saída para aí...

    Achas que devo levar catana daqui, ou compro por aí?

    (vou-me rindo enquanto posso)

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  4. Parabéns Miguel, o texto está muito bem escrito e bastante informativo. Obrigado por partilhar e votos de boa estada por aí.
    E votos de bom MBA :)
    Abraço,
    PB

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  5. Recebi uma proposta para ir para Luanda trabalhar. O ordenado não é muito alto para o sítio (2500euros), mas dão casa, carro, empregada e^3 viagens por ano a Portugal. Ah, e o almoço.
    Gostava de saber o que pensa..É possível sobreviver-se?
    se puder enviar-me um mail com a sua opinião - marta.c.f.rocha@gmail.com

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  6. Boa noite Marta.
    Depende do que vai fazer.
    Secretariado, comercial, etc.
    As 3 viagens estão escritas ou tem um valor atribuído? São situações diferentes.
    Depende do ramo.

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  7. Só agora vi a data.
    Peço desculpa, foi precisamente à um ano.
    Uii.

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  8. isto é tudo verdade e podia acrescentar mais ainda.

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  9. Bom dia,
    A minha mãe nasceu em Angola e trabalhou, mas em 1975 teve de vir para portugal, sabemos porquê. Agora encontra-se com idade para reforma, porém faltam-lhe dois anos de serviço. Em Angola trabalhou mais de cinco anos e tenho comprovativos. Será que me pode ajudar a encontrar uma forma de lhe serem reconhecidos esses anos? andreiaferreirapinto@hotmail.com
    obrigada

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